“Sem ‘estado de alma’ nenhum, sonho ver-te. A tua beleza pra mim está em existires. A tua grandeza está em existires inteiramente fora de mim.” (Fernando Pessoa)
Me olho no espelho tento ver meu rosto, mas ele reflete apenas a tua imagem. Minha beleza silenciosa te grita, não há resposta nem eco. Oco. Ainda nem sei se existes, era mais calmo quando havia certeza, mas agora a tua imagem se fragmenta num caleidoscópio humano de cores e sensações mutantes e adversas. Agora me vejo montando pedaços de ti, formando e reformando-te em arte. É meu querido, sou artista de ti−sem dom. E o meu rosto é apenas uma loucura obscena, um nu de mim mesma. Há um sem-número de imagens refletidas num jogo de espelhos policromos. Há a tua quase existência sendo refeita num giro ausente da minha figura triste e invisível. Loucura? Delírio?
Por vezes penso em ti a ponto de te inventar, outras ao cúmulo de te ser. Seja uma criação da minha irredutível carência, seja uma necessidade da tua existência, seja pura loucura (é loucura), o fato é que já não sei até que ponto somos nós, até que ponto somos, tu e eu, sós. Deves ser a parte que me falta, o quem em mim não existe, és, meu querido, a contemplação dos meus olhos tristes. Ou não, és apenas tu (?). Mas a Loucura já me disse que “tirada a ilusão, toda obra desmorona” e o que seria de mim sem a doce ilusão da tua existência? O que seria da ilusão sem mim? Existir.
E eu, adoradora de enigmas, que desvendo os segredos mais íntimos num olhar, num sorriso. Eu que sempre sei o que se passa (não em mim, pois sou meu maior mistério) nas mentes e corações. Eu que num minuto de silêncio ouço confissões involuntárias. Eu que te crio e recrio nem sequer consigo entender, desvendar teu mistério.
É essa a imagem que tenho de ti, a que tu me permite ter: pedaços que dançam no meu pensamento, fragmentos dispersos e confusos. Basta uma palavra tua e tudo se esclarece. Mas não, nunca me digas! Te amo por não entender. A beleza de tudo isso é desconhecer, é poder te amar e não ter, é poder sentir e não beijar. Mas como quero, aí sim será mais belo.
Também não tente me entender, sou incoerente e tenho uma inquietude infindável em minha alma. Nunca espere de mim certeza, pois a “coerência é o fantasma das mentes pequenas” e a inconstância é minha essencial substância. Não há máscara nenhuma a encobrir meu rosto, há multifaces desnudas e misturadas. Escolha a que mais te agrada ou queira-me inteira: tenha-me todas.
Me chame do que quiser, sou louca sim: amo. Amo sem entender, as vezes nem é amor, mas quero tanto que amo mais e mais.
Tenha medo de mim, pois sou o caminho no qual podes te perder (as vezes encontramos nosso destino no caminho que tomamos para fugir dele). Tenha medo porque a felicidade assusta.
Fuja e me encontre no mesmo jogo de espelhos que te vejo, onde me perdi: caleidoscópio humano em si.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Qual o sentido?